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Flexibilizar para conciliar

Flexibilizar para conciliar

Semana de 4 dias de trabalho

31.05.11, flexbilizar ~ conciliar


O projeto de Filipe Miguel Ferreira, 33 anos, economista, visa alterar a relação entre dias de trabalho, rendimento e dias de lazer - se um trabalhador produzir o mesmo em menos tempo, mantém o rendimento, mas ganha mais tempo de lazer.

O impacto da reconciliação trabalho-família na fertilidade e nos papéis da paternidade na Europa – Suécia

30.05.11, flexbilizar ~ conciliar
A reconciliação trabalho-família e o novo papel da paternidade fazem parte das políticas modernas para a família, em prática na Suécia há quase 40 anos. A Suécia tem um sistema abrangente de infantários, baseado na igualdade de géneros e no emprego da mulher a tempo inteiro. Mas os resultados destas políticas começam a notar-se e não são unânimes. Por um lado as melhores práticas na Suécia incluem o investimento generoso nos cuidados precoces à infância. Por outro, a utilização deste investimento exclusivamente em infantários, para crianças de 1 a 5 anos, pode ser considerada uma das piores práticas da Suécia.

Chamo-me Jonas Himmelstrand. Sou sueco e estou aqui como representante da organização familiar sueca Haro. Sou casado e tenho três filhos, o que não é muito se comparado com diversos outros membros da Haro.

Pediram-me para falar sobre as melhores práticas para o equilíbrio trabalho-família e a paternidade. Fá-lo-ei do ponto de vista sueco, com base nas minhas investigações e nas experiências da minha organização. Gostaria de começar por comentar as outras apresentações feitas dizendo que, a meu ver, o bem-estar infantil e o desenvolvimento saudável das crianças devem ser o ponto de partida para esta discussão.

Não é fácil apresentar uma imagem clara da Suécia relativamente a estas questões. As nossas melhores práticas tendem a estar ligadas às nossas piores práticas. A Suécia tem excelentes estatísticas de baixa pobreza infantil, baixa mortalidade infantil, esperança de vida elevada, igualdade de géneros e uma rede de infantários abrangente e acessível. Mas estas estatísticas não formam o quadro completo.

Podemos ter uma baixa taxa de pobreza infantil e elevada riqueza material relativamente a diversos outros países europeus, mas muitas crianças suecas sofrem de acentuada pobreza emocional.

Ainda assim, uma das inquestionáveis melhores práticas é a licença parental sueca de 16 meses, o que significa que não temos bebés nos infantários. Mas após estes meses de licença parental, o caso muda dramaticamente de figura.

Poder-se-ia argumentar que uma das melhores práticas suecas é o investimento de 15.000 euros por criança por ano em 90% de todas as crianças entre os 18 meses e os 5 anos de idade. O outro lado da moeda é que é o nosso governo quem decide como é que este dinheiro vai ser gasto, e não os pais. Não existe apoio estatal aos cuidados prestados às crianças em casa, como as crianças criadas pela mãe, pai, avó ou outro parente ou amigo chegado.

Pode também ser considerada uma das melhores práticas suecas o incentivo aos pais para tirarem mais tempo de licença parental. Os pais suecos tiram cerca de 20% de todas as licenças parentais. No entanto, estes números escondem o facto de que o tempo que as crianças suecas passam com os pais sofreu uma redução drástica nos últimos 40 anos, devido às políticas dos infantários.

Além disso, esta discussão sobre a paternidade trata basicamente dos pais que tiram a licença parental quando os filhos têm entre 8 e 16 meses. A maior parte da paternidade acontece mais tarde, e continua até e para além da idade adulta dos filhos. Além disso, neste aspecto os números relativos aos pais que tiram licença de paternidade não contam toda a história da paternidade. Tal como demonstrarei em breve, existe todo um novo paradigma da paternidade emergente na Suécia, com pais muito activos, aos quais estes números não fazem justiça.

Vejamos os aspectos básicos do modelo sueco de cuidados à infância.


Modelo sueco dos cuidados à infância
Na Suécia não há bebés com menos de um ano nos infantários. Isto deve-se à longa licença parental, entre 13 e 16 meses. Trata-se de uma boa prática sueca.

De todas as crianças Suecas entre os 18 meses e os 5 anos de idade, 92% estão em infantários por períodos de tempo variados. O infantário a partir dos 18 meses de idade é uma norma na Suécia.

Os infantários suecos são subsidiados pelo Estado em mais de 90%. Assim, o custo dos infantários para os pais é muito baixo, tipicamente 120 euros por mês para o primeiro filho. Nenhuma família paga mais de 285 euros por mês, independentemente do rendimento familiar ou do número de crianças em infantários. Chama-se a isto a taxa máxima (maxtaxa), uma taxa concebida para incentivar a utilização dos infantários junto aos pais.

O custo efectivo dos infantários na Suécia é de mais de 15.000 euros por criança por ano, Segundo o instituto de investigação do governo sueco.

Não existe qualquer subsídio nacional para quem opte por ficar em casa com as crianças. No entanto, num pequeno número de municípios existe a possibilidade de um pequeno subsídio de 300 euros por mês no máximo. Este subsídio só pode ser utilizado após o final da licença parental e só até aos três anos da criança, e há várias regras que dificultam a sua obtenção. O motivo político utilizado para justificar estas dificuldades é o receio mostrado por alguns partidos políticos de que o subsídio se tornasse demasiado popular.

Na Suécia, todos os impostos são totalmente individualizados, e não existe qualquer possibilidade de reduções fiscais para as famílias ou para quem fique em casa com os filhos.

O modelo da família com dois ordenados e as crianças em infantários é fortemente incentivado por todas as instituições do governo sueco.

Da mesma forma, ficar em casa a cuidar das crianças é fortemente desencorajado na Suécia pelo governo, instituições estatais, sistema de saúde, sindicatos de educadores de infância e até pelos meios de comunicação social. Os motivos mais fortes apontados para tal são a igualdade de géneros, o “direito” das crianças a frequentar o infantário e a ideia de que os pais dão um melhor contributo nos respectivos empregos do que na educação os filhos em casa, educação essa que se crê ser melhor quando dada por educadores formados.

Vou agora apresentar os resultados menos agradáveis do modelo sueco. Recordem que se trata de um país com elevada riqueza material e uma taxa baixa de pobreza infantil.

Forte redução da saúde psicológica dos jovens.
Muitos estudos suecos realçam este facto, com grande preocupação. 20 a 30 % dos nossos adolescentes mostram sinais de stress psicológico contínuo com preocupações, ansiedade e dores físicas. Este fenómeno é três vezes pior hoje em dia que há 25 anos. Segundo um estudo governamental, esta diminuição da saúde psicológica ocorre mais rapidamente na Suécia que em qualquer um dos outros 11 países europeus comparáveis: Finlândia, Dinamarca, Noruega, Hungria, Suíça, Áustria, Bélgica, País de Gales, Espanha e Escócia.

Resultados e disciplina escolar em declínio nas escolas suecas.
Em 30 anos, a Suécia passou dos lugares cimeiros da tabela mundial no que diz respeito a resultados escolares, para uma posição média. A disciplina nas salas de aulas suecas é bastante má. A situação está entre as piores da Europa.

Elevada taxa de baixa por doença entre as mulheres.
Mais uma vez, é das mais elevadas da Europa. Os motivos são psicossociais. Muitas mulheres suecas com empregos a tempo inteiro na altura em que tinham filhos pequenos reformam-se entre os 55 e os 60 anos devido a vários motivos médicos psicossociais.

Podemos perguntar o que se ganhou impondo os cuidados à infância e o trabalho em simultâneo, se de qualquer forma se perdem dez anos de trabalho devido à reforma antecipada.

Trabalhadores dos infantários no topo das estatísticas de baixa por doença.
Os funcionários dos infantários suecos estão no topo das estatísticas de baixa por doença, especialmente no que diz respeito à baixa de longa duração.

Deterioração das capacidades parentais, mesmo entre a classe média
Um estudo patrocinado pela UE e executado pela investigadora escolar sueca Britta Johansson demonstrou que até os pais suecos saudáveis, inteligentes e razoáveis têm dificuldades em ser pais hoje em dia. Na sua opinião, estes pais têm falta de conhecimentos quanto às necessidades dos filhos e não conseguem impor limites. Ela escreve (tradução minha):

A oferta pública de infantários a tempo inteiro parece fazer com que muitos pais percam o controlo à sua própria responsabilidade. Acreditam/querem que os seus filhos sejam educados no sistema pré-escolar/escolar e acreditam que lá se encontram os peritos sobre os seus filhos.

Diz ainda que o sistema pré-escolar/escolar não colmata as lacunas provocadas pela falta de tempo e confiança na paternidade por parte dos pais.

Deterioração da qualidade dos infantários suecos.
Três peritos reconhecidos suecos escreveram recentemente num livro que a qualidade dos infantários suecos já não é elevada, e que em algumas crianças o desenvolvimento ficará declaradamente comprometido devido a esta falta de qualidade.

Taxa de fertilidade total: elevada para a Europa, baixa em comparação com os países nórdicos
Tanto a Noruega como a Finlândia têm taxas de fertilidade mais elevadas que a da Suécia. Nenhuma chega às 2,1 crianças necessárias para uma reprodução total da população.

Mercado laboral com elevada segregação por género
A Suécia tem um mercado laboral com elevada segregação por género. Caracteristicamente, as mulheres trabalham na educação e prestação de cuidados, e os homens na indústria e cargos públicos mais elevados.

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O problema parece ser o facto de a liderança política sueca ignorar a importância da ligação entre a criança e os pais. A psicologia moderna da ligação diz claramente que o laço emocional entre pais e filhos não pode ser substituído nem sequer pelo melhor dos currículos, aprendizagem ou métodos pedagógico.

Poder-se-ia dizer que o problema básico das políticas familiares suecas é que o cuidado individual das crianças se tornou uma decisão política estatal com base em ideologias políticas, e não na decisão dos pais baseada nas necessidades de cada criança.

O que querem os suecos ?


- Um grande número de estudos durante as últimas décadas demonstram que a grande maioria das mulheres suecas quer passar mais tempo com os filhos pequenos.


- Um estudo recente demonstrou que 7 em cada 10 mães pretendem passar mais tempo em casa com os filhos. Este desejo é mais frequente nas mães mais jovens.


- Mais de metade das mães acredita que mais mães gostariam de ficar em casa com os filhos, se pudessem


Alguns destes pais suecos entraram em acção. Após 40 anos de políticas familiares baseadas nos infantários e emprego das mulheres a tempo inteiro, vemos um movimento que vai além deste modelo, um novo paradigma familiar que surge em famílias pioneiras, com novas soluções para a maternidade, paternidade e equilíbrio trabalho-família.

Estes pais querem cuidar dos filhos e trabalhar, mas não ao mesmo tempo. Não querem ter de trabalhar e ter crianças pequenas ao mesmo tempo. Na verdade, querem que um dos pais fique em casa nos primeiros 3-5 anos da vida da criança, para depois trabalhar em part-time até aos 18-19 anos dos filhos.

O que é interessante é que estas famílias suecas pioneiras não se baseiam em tradições nem na religião. Isso não existe na Suécia. Estes pais são exclusivamente motivados pela experiência de ligação aos filhos e pela observação da influência positive desta ligação no desenvolvimento das crianças.

Seguem-se algumas características deste novo paradigma familiar; não façam perguntas ao nosso governo, ele negará a sua existência.

Um novo paradigma familiar


Mãe e pai igualmente comprometidos durante toda a infância.
O pai e a mãe estão igualmente comprometidos na educação da criança, tanto a nível de tempo como de compromisso emocional, por um período de 18 anos, e não apenas de 18 meses.

Cuidados precoces em casa prestados pela mãe, com apoio do pai.
O valor da maternidade e da amamentação é reconhecido nestas famílias. Também se reconhece o apoio de que a mãe precisa enquanto mãe de um bebé pequeno, um apoio que será prestado pelo pai.

Cuidados conscientes por parte do pai, numa participação crescente a partir dos 2-4 anos de idade.
Segundo estes pais, os cuidados precoces devem ser prestados pela mãe, com o apoio do pai, e este começa a ter um papel mais preponderante por volta dos 2-4 anos da criança, uma idade em que outras crianças vão para o infantário. Na perspectiva de uma infância de 18 anos, a contribuição dos pais será substancial e equivalente.

Forte ênfase dada à ligação emocional aos pais.
Estes pais descobriram o poder da ligação emocional na paternidade, uma ideia bem expressa pelo psicólogo canadiano, Dr. Gordon Neufeld, no seu livro “Hold on to your kids – why parents need to matter more than peers” (Agarre bem os seus filhos – razões por que os pais têm de ter mais importância que os pares).

Na idade escolar, muitas mães iniciam um negócio próprio.
Quando as crianças vão para a escola, muitas mães começam a trabalhar em part-time, começam negócios próprios, fazem voluntariado ou arranjam um emprego a tempo inteiro. Estas mães entram no mercado de trabalho e na sociedade com poder e convicção, com experiências pessoais profundas que são difíceis de encontrar noutro lado.

A família recebe as crianças directamente da escola
Não recorrem a actividades extracurriculares. A mãe, o pai, um familiar ou vizinho recebem a criança directamente após a escola e falam com ela sobre o que aconteceu durante o dia.

Alguns pais chegam a ensinar os filhos em casa.
Alguns pais, devido ao seu estilo de vida, ao facto de terem crianças altamente sensíveis ou por outro motivo qualquer, optam por ensinar as crianças em casa. Trata-se de um movimento educacional em rápido crescimento em muitos países ocidentais. Os estudos demonstram que os resultados são excelentes, tanto a nível académico como a nível social.

Isto acontece em famílias maiores, caracteristicamente com3-6 filhos.
De um ponto de vista demográfico, é necessário compreender e apoiar estas famílias. Têm muitos filhos e tomam bem conta deles, de forma consciente.

Ainda não foram feitos estudos sobre estas famílias pioneiras. Mas se juntarmos os estudos internacionais às experiências suecas, o resultado parece claro. Estas crianças têm por norma bons resultados, tanto a nível emocional como social e até escolar.

Um resumo daquilo que podemos aprender de 40 anos de políticas familiares suecas modernas poderia ser mais ou menos assim:
Uma licença parental generosa faz com que não haja bebés nos infantários.
Os infantários na Suécia recebem crianças apenas a partir dos 12 meses de idade, o que é uma boa prática sueca.

Educar crianças custa dinheiro; alguém tem de o pagar.
A Suécia investe uma quantia generosa nos cuidados precoces à infância (uma boa prática), mas infelizmente a utilização deste dinheiro guia-se por uma ideologia política e não pelas necessidades e desejos das crianças e dos pais (uma má prática).

O governo deve ser neutro no que diz respeito aos cuidados à infância.
Os pais têm de ter uma liberdade real ao escolher entre diferentes formas de cuidados à infância. Assim, o governo tem de apresentar aos pais um leque completo de opções, entre infantários, ficar em casa, amas, avós ou outros.

Apoio financeiro equitativo independentemente da forma de cuidados à infância.
Esta liberdade de escolha, bem como a neutralidade do governo relativamente a diferentes formas de cuidados à infância, têm de ser apoiadas por apoio financeiro equitativo a todas as formas de cuidados, de maneira a tornar-se razoável e justo. Se os infantários forem subsidiados pelo estado, os cuidados em casa também têm de receber um apoio razoavelmente equitativo, através de um tipo de subsídio ou benefício fiscal aos pais, tornando a opção de ficar em casa com as crianças possível para a maior parte das famílias, seja qual for a constelação.

Incentivar os pais a escolher o tipo de cuidados à infância em consciência.
Os pais devem ser incentivados a utilizar a liberdade de escolha no que diz respeito aos cuidados à infância. Têm de prestar atenção aos filhos e à situação familiar, e optar pelo que parecer mais adequado, relativamente ao papel da mãe e do pai, ao equilíbrio trabalho-família e à escolha do tipo de cuidados à infância. O governo tem de dizer que a escolha do tipo de cuidados à infância cabe aos pais, em última análise, não ao governo, e que este tem de respeitar a escolha de cada família, seja ficar em casa com os filhos, infantário, ama, avó, vizinho ou outro.

Cuidar das crianças em casa deve ser uma parte respeitada da carreira profissional e da vida.
A escolha consciente de ficar em casa com os filhos proporciona excelentes oportunidades de desenvolvimento pessoal para os pais. Cada vez mais as empresas e sector público se apercebem disto. Alguém que tenha ficado em casa a tomar conta dos filhos leva consigo para o emprego competências sociais e uma maturidade emocional que são excelentes contributos para qualquer ambiente de trabalho.

Os cuidados à infância controlados pelo estado fazem desta questão uma questão política.
É necessário tomar consciência de que o controlo político dos cuidados à infância leva a decisões políticas sobre os cuidados à infância, o que raramente é bom. A perspectiva política é curta, normalmente 4 anos. A perspectiva parental é longa, 80 anos ou mais. Os pais estão simplesmente dispostos a sacrificar mais pelos filhos do que qualquer democracia política ocidental típica alguma vez poderia estar.

A família é a principal instituição da sociedade no que diz respeito a relações próximas -  é uma chave para a saúde, crescimento e maturidade.
Seja qual for a sua definição, é necessário reconhecer a família como a principal instituição da sociedade no que diz respeito a relações próximas, uma vez que é o pré-requisito chave para a saúde, crescimento e maturidade humanos, e, em última análise, para a sobrevivência da espécie.
Outra conclusão lógica dos factos nesta apresentação é, naturalmente, que o modelo familiar sueco deve ser sujeito a estudos multidisciplinares extensivos antes de qualquer outro país tentar copiar o modelo sueco.


Obrigado pela sua atenção!


Jonas Himmelstrand
Perito em estudos familiares na organização familiar sueca Haro
http://www.haro.se/

Transcrição do texto da apresentação feita na Conferência sobre alterações demográficas da Presidência húngara em Budapeste, no dia 29 de Março de 2011. Apresentação feita enquanto perito em investigação familiar e membro do conselho nacional da organização familiar sueca Haro.
Tradução : Carla Palhares da Costa

Cidadãos contra a inércia

29.05.11, flexbilizar ~ conciliar

Nem todos os portugueses são amorfos. Nem todos se abstêm, quer de votar quando é tempo de eleições quer de intervir na sociedade em que vivem. Há quem não se resigne e lute pelas causas em que acredita.
Nem todos os portugueses ficam sentados no sofá a carpir mágoas, a queixar-se da vida, da crise, do desemprego, do tempo. Há quem crie movimentos, quem defenda uma causa, quem acredite que pode fazer a diferença. Há quem agite a sociedade civil com energia e optimismo. A NS' foi ouvir cinco pessoas que vencem a inércia para que Portugal mude. Pouco ou muito, não importa. Sempre é melhor do que nada. Sempre é melhor do que ficar a protestar por entre dentes. Sempre é melhor do que ficar inerte a ver a novela.
Movimento Revolucionar para Flexibilizar
Ter filhos e passar dez horas ou mais dentro de um escritório é uma ginástica difícil de conseguir. É mais contorcionismo do que ginástica. Nem lucra o trabalho, onde as mães e os pais permanecem esmagados pela culpa de não estarem em casa, nem ganha a família, pouco apoiada por gente tão trabalhadora. Assim, Portugal vê decrescer os números da natalidade e os da produtividade também.Carla Rodrigues, 36 anos, já foi directora de publicidade mas deixou a profissão para se dedicar à maternidade. Quando começou a pensar em conjugar a carreira com os filhos concluiu que o ideal seria um part-time. Mas rapidamente percebeu que Portugal não viabiliza esta opção. Mais: nem sequer a põe em cima da mesa: «O nosso mercado de trabalho não tem em conta a realidade que o rodeia e afecta directamente. Então pensei: em vez de me queixar talvez pudesse juntar outras pessoas que pensam como eu e fazermos por mudar o estado das coisas. E assim foi.»O movimento foi preparado no blogue apanhadanacurva.blogspot.com e no dia 28 de Abril foi feito um apelo à flexibilização do mercado de trabalho. A forte adesão ao apelo veio comprovar o que Carla já sabia: «Poucas pessoas andam a viver bem com esta falta de conciliação entre o trabalho e a família. Em alguns comentários sugeriu-se a criação de um movimento cívico, e assim estava criado o Revolucionar para Flexibilizar. Desde então, o movimento nunca mais parou. No Facebook há quase trezentas pessoas que garantem gostar da iniciativa. E estão previstas, para já, duas linhas principais de actuação: «Visamos, por um lado, a mudança de mentalidade, e aqui refiro-me às mulheres e aos homens que devem assumir os seus dois papéis essenciais de trabalhador e de mãe e pai; a quem gere as empresas, que deve reconhecer que a produtividade do trabalhador é proporcional à sua satisfação; ao Estado, que deverá reconhecer os benefícios da conciliação entre família e trabalho (aumento da demografia, crescimento do mercado de consumo, competitividade do tecido empresarial, bem-estar e saúde, educação das crianças, etc.). Por outro lado, visamos a protecção de políticas de conciliação entre a família e o trabalho através da criação de medidas jurídicas.»Para que essa mudança política e estrutural aconteça, o movimento acabado de criar está a contactar organizações que já actuam junto de famílias ou do tecido empresarial, empresas que já tenham uma cultura e organização conciliante entre a família e o trabalho e estejam a lucrar com isso, e todos os partidos políticos (o movimento é apartidário). «Contamos também organizar debates entre as várias partes implicadas e criar eventos públicos.»Tudo para que mulheres e homens possam realizar-se, quer profissionalmente quer enquanto mães e pais. Tudo para que o país seja menos rígido e intolerante para com aqueles que querem conciliar os dois lados da vida. Porque é possível, tem de ser possível, haver famílias e trabalhadores mais felizes e completos.

Movimento Adere, Vota e Intervém dentro de Um Partido
Tudo começou com uma constatação surpreendente: nem ele nem nenhum dos seus amigos ou conhecidos estavam filiados num partido político. No entanto, todos os seus amigos e conhecidos se queixavam do estado da política, dos políticos e do país. Nesse dia foi como se uma lâmpada se acendesse dentro da cabeça de João Nogueira dos Santos, 39 anos, gestor de marketing. «Como nos queixamos dos partidos se nem sequer fazemos por lá estar, como militantes, para votar e escolher melhor os dirigentes ou dar ideias e influenciar? Como é possível sermos uma geração que se queixa de forma tão inconsequente?» Depois da perplexidade, João decidiu que ia filiar-se num partido, mas ia fazer mais do que isso: «Pensei: vou convencer a minha geração a filiar-se nos partidos. Seja qual for, não importa. O importante é que as pessoas se filiem no partido que mais se aproxima das suas convicções. Porque, se dotarmos os partidos de uma imensa maioria de cidadãos que têm vida e profissão fora do âmbito político, com toda a certeza a política será melhor.» Nascia assim o movimento Adere, Vota e Intervém dentro de Um Partido. Cidadania para a Mudança. Um movimento cujo rastilho começou no Facebook (tem neste momento quase cinco mil membros) e num blogue (aderevotaintervem.blogspot.com), mas que rapidamente saltou para os jornais e para as televisões.João Nogueira dos Santos não tem ilusões. Sabe que mudar mentalidades é tarefa morosa e complexa: «Quando criei o movimento pensei que ia estar envolvido nisto uns dois anos. Agora já percebi que é trabalho para uns dez. Nos Estados Unidos, há uma iniciativa que se chama Rock the Vote e que anda há vinte anos a fazer isto. A convencer os jovens a votarem dentro dos partidos.»A comparação com a América fê-lo ter outro momento de espanto. «Nos EUA, 18 por cento da população votam nas eleições internas dos partidos. Barack Obama foi escolhido como candidato do Partido Democrata porque uma enorme multidão de cidadãos participou nas eleições do Partido Democrata. Em Portugal, menos de um por cento da população participa nas eleições internas dos partidos. Ou seja, em Portugal "no we can"t". E é preciso mudar o estado das coisas. É urgente! Votar de quatro em quatro anos é claramente insuficiente.»Mas porque tem Portugal tamanho desinteresse pela vida política activa? Porque não existe uma mobilização por este tipo de cidadania? «No final dos anos 1980/1990, as gerações de estudantes universitários eram muito individualistas. Prevalecia o espírito Wall Street: "Eu quero é ganhar dinheiro, enriquecer, ter um bom carro, uma boa vida." Com a entrada de Portugal na Comunidade Europeia, fomos avassalados por esta cultura de novo-riquismo. Fomos egoístas. Mas temos de perceber que, se as coisas estão como estão, a culpa também é nossa. Por isso, temos de injectar sangue novo nos partidos. Temos de renovar os partidos. Só assim poderemos eleger gente de qualidade.»Não há dia nenhum em que João não se empenhe na sua luta. No Facebook ou no blogue, é possível ler diariamente novas reflexões, novas mensagens, novos apelos à adesão aos partidos. O objectivo é só um: mudar o estado das coisas. E quando se lhe pergunta se tem ambições políticas para si próprio, sorri e responde: «Eu acho que não há ambição maior do que esta, de mudar a nossa democracia, de mudar a mentalidade da minha geração. Se conseguir isto, estarei plenamente realizado. Se conseguir, não! Porque já não estou sozinho. Já somos muitos. Muitos cidadãos cansados do discurso miserabilista e queixoso. E por isso é evidente que vamos conseguir.»
Acredita Portugal
Para ele, o principal problema de Portugal é este: a falta de estímulo ao empreendedorismo. Um país que não arrisca é um país que não petisca. José Miguel Queimado, 27 anos, consultor, tem a convicção absoluta de que Portugal, se desse a mão a quem sonha, podia voar mais alto. «O nosso país não ajuda uma pessoa a acreditar em si. Não há um encorajamento da sociedade, pelo contrário. Há tantos entraves ao sonho, e tantas barreiras que qualquer pessoa que queira ser empreendedora ou tem muito dinheiro e conhecimentos ou rapidamente desiste.»José Miguel podia ter encolhido os ombros e seguido com a sua vida. Mas não. Decidiu ajudar. E criou, com um grupo de amigos, a associação Acredita Portugal. Uma associação sem fins lucrativos que ajuda os portugueses a serem empreendedores, a acreditarem nos seus sonhos. Como? Através do concurso «Realize o Seu Sonho» (as inscrições para a segunda edição terminaram no dia 15 de Maio).«Este concurso funciona da seguinte maneira: as pessoas inscrevem-se online e dizem que negócio gostavam de criar. Depois vão passando por várias etapas. Criámos um software chamado Dream Factory, que faz perguntas simples a qualquer português que tenha um sonho para desenvolver (e é mesmo para qualquer português: na primeira edição houve muitos semifinalistas que não tinham sequer a quarta classe). Estas perguntas permitem atingir três objectivos: estruturar o sonho, testá-lo (para perceber se tem viabilidade no mercado) e ajudar a desenvolver o processo de implementação. Ou seja, no final queríamos que todos os sonhadores saíssem da Dream Factory com um business plan [plano de negócio].»Para dar a conhecer a Acredita Portugal e o concurso «Realize o Seu Sonho», José Miguel Queimado e os outros membros da associação decidiram pôr-se a correr pelo país. Durante 15 dias, correram oitocentos quilómetros. «Decidimos fazê-lo a correr porque quisemos mostrar que não basta ter um sonho. É preciso esforço, luta, dedicação. É preciso correr atrás dos nossos sonhos.»A primeira edição do concurso, em 2008, foi um sucesso. A organização esperava vinte ou trinta participantes e houve mais de setecentos. O primeiro lugar ganhou sessenta mil euros, o segundo 7500 e o terceiro cinco mil euros. Mas houve muitos inscritos para quem a formação recebida online foi mais importante do que a vitória propriamente dita.A segunda edição, acabada de fechar, contou com 2960 inscrições. Prova provada de que em Portugal existem pessoas com sonhos, existe gente com vontade de arregaçar as mangas e criar um negócio. Gente empreendedora. Mas com medo também. E com falta de ferramentas para saber lidar com a burocracia e com as leis e com todos os entraves que surgem no caminho. Por isso, a Acredita Portugal tem tido um papel importante. «Temos neste momento três escritórios de advogados a trabalhar connosco pro bono e que dão workshops online grátis, abertos a todos, para ajudar no vocabulário empresarial, nos trâmites legais, na documentação necessária, nas análises de concorrência, etc. Porque mais importante do que dar o peixe às pessoas é ensiná-las a pescar.» José Miguel Queimado está empenhado em formar excelentes «pescadores». Porque sente que essa é a sua missão. Porque acredita em Portugal.
Movimento Anti-Corrupção
Luvas. Cunhas. Favores. Empurrõezinhos. Clientelismos. Jeitinhos e jeitões. Micael Sousa, 28 anos, começou a ter desde muito cedo consciência da corrupção que singra no nosso país. E simultaneamente compreendeu que esse era um dos grandes males da nossa sociedade. «Acho que foi na adolescência. Quando comecei a querer conhecer o nosso país e o que o distinguia dos países da Europa Central e do Norte, uma das questões que sobressaiu sempre, em nosso desfavor, foi a corrupção. Não só a grande como a pequena. É ética e matematicamente tão grave os poucos que roubam milhões como os milhões que roubam pouco.»À medida que ia estudando o assunto, mais convicto ficava de que queria combater o fenómeno. «Comecei a pesquisar e fiquei surpreendido por não haver em Portugal um grupo, um movimento que se preocupasse com o assunto. Li vários ensaios, vários estudos, e um livro muito bom, escrito por um investigador português, Luís de Sousa, A Corrupção e os Portugueses. Está lá tudo. Quanto mais lia, mais sentia que era minha obrigação fazer alguma coisa. E em Março de 2010 nasceu o Movimento Anti-Corrupção, um movimento que visa a consciencialização para este problema.»Há pouco tempo surgiu também a TIAC (Transparência e Integridade - Associação Cívica), com a qual Micael Sousa tem trabalhado em parceria. «No nosso entender, este fenómeno é cultura, de maneira que a consciencialização deve começar o mais cedo possível, em casa, nas escolas.» Assim, o blogue movimentoanti-corrupcao.blogspot.com e a página do movimento no Facebook põem ao dispor uma petição pública em que são propostos três modos de actuação através da prevenção: «A informação aos alunos nas escolas sobre o que é a corrupção e de que forma se manifesta (passar à frente numa fila já é uma forma de corromper as regras); aulas de ética e deontologia nas universidades; e campanhas de intervenção junto da população em geral. A petição já tem mais de 1300 assinaturas.»Micael Sousa é formado em Engenharia Civil e está a concluir o mestrado em Energia e Ambiente. Mas o combate à corrupção é a sua grande tarefa, tão grande que muitos o apelidam de utópico, de fantasioso, de irrealista. Ele sabe que tem muito trabalho pela frente e acredita que vale a pena lutar contra um monstro tão grande e tão enraizado na cultura nacional. «Quanto mais difícil melhor. Essa é a minha maior motivação. Mas não creio que seja utópico, porque não tenho a pretensão de acabar com a corrupção. Quero contribuir apenas para que algo mude em relação a isto. Nem que seja as pessoas tomarem consciência de que a corrupção existe e é eticamente reprovável. Não proponho nada de revolucionário, nada de radical. Isto é para ir fazendo, com calma. Até porque as grandes mudanças de mentalidade nunca se fizeram de um dia para o outro.»
Ignite Portugal
Perder um voo não tem de ser necessariamente mau. Miguel Muñoz Duarte que o diga. Estava então expatriado num país da América Latina e perdeu o voo de regresso a Portugal, quando fez escala algures nos Estados Unidos (já não se lembra exactamente onde). Em frente ao hotel onde ficou alojado estava a decorrer um evento especial: vários oradores falavam durante cinco minutos, e o seu discurso era acompanhado por vinte slides que rodavam automaticamente a cada 15 segundos. A iniciativa chamava-se Ignite. E Miguel Muñoz Duarte agradeceu logo o facto de ter perdido o avião. «Foi uma noite fantástica, com oradores incríveis e um espírito de partilha muito giro. Tomei nota do nome do evento, voltei a Portugal, montei o meu negócio, fiz a minha vida e, um dia, reencontrei aquele nome: Ignite. E pensei: e se fizéssemos isto em Portugal?»Se bem o pensou, melhor o fez. A 15 de Outubro de 2009, na Sociedade Guilherme Cossoul, em Lisboa, teve lugar o primeiro Ignite Portugal.«Esperávamos cinquenta pessoas, apareceram 120. Tivemos 15 oradores inspiradores e aquele ambiente de partilha a que eu tinha assistido nos Estados Unidos repetiu-se ali, de forma mágica. Desde então tem vindo a crescer, a crescer, a crescer. No último evento tivemos seiscentas pessoas, muitas candidaturas para oradores, muitas cidades do país a quererem organizar Ignites.»Mas, afinal, o que é isso de Ignite? «O Ignite é um evento periódico, aberto a todos. Ou seja, quem quiser ser orador inscreve-se. Quem quiser ir assistir paga o bilhete e assiste. É absolutamente democrático e informal. Não temos mesa de presidência nem canasta de flores. Temos uma palete onde as pessoas falam, à imagem do Speaker"s Corner de Hyde Park, em Londres. O objectivo? Agitar a sociedade civil, pôr as pessoas a pensar, a falar, a partilhar ideias inspiradoras, projectos, experiências de vida, boas histórias, descobrir talentos.»Aquela que é apontada como uma das fragilidades do projecto é, para Miguel Muñoz Duarte, uma das suas grandes riquezas: serem pessoas comuns os oradores e não gurus ou especialistas versados numa matéria. «Há quem diga: mas quem são estas pessoas para virem para aqui falar? Para mim é muito mais inspirador serem pessoas como eu a partilhar as suas visões extraordinárias do mundo do que se fossem pessoas extraordinárias a fazê-lo.»O Ignite Portugal já vai na 12.ª edição (igniteportugal.clix.pt). A organização diz que é necessária uma boa dose de voluntarismo e outra tanta de carolice. Miguel recusa ser o centro dos holofotes e prefere agradecer aos cinco ou seis voluntários mais chegados e aos cerca de 25 colaboradores eventuais. «Existe na nossa organização desorganizada um espírito e uma missão que não se encontram facilmente noutros ambientes. E deve ser por isso que recebemos por semana cerca de cinco pedidos para se juntarem aos voluntários. É um fenómeno de bondade e humanismo fantástico.Para além destes voluntários directos, existe uma série de parceiros que contribuem também para montar os eventos e uma série de co-hosts locais nas várias cidades e universidades que vão acolhendo o evento.» A LxFactory, em Lisboa, e os MausHábitos, no Porto, têm sido alguns dos locais que acolhem o Ignite. Já para não falar dos vários parceiros que ajudam em várias frentes: a filmar e fotografar, a arranjar comes-e-bebes para os intervalos, a montar o sistema de som, etc. Recentemente, a Optimus começou a patrocinar o Ignite Portugal. Uma boa notícia que enche Miguel Muñoz Duarte de orgulho: «Isto vai permitir ao Ignite Portugal chegar a mais cidades, a mais locais e a mais pessoas, fazendo que a nossa missão seja potenciada como sonhamos, ajudando a descobrir mais ideias e talentos desconhecidos do nosso país... que tanto precisa.»

por Sonia Morais Santos
Noticias Magazine 28-05-2011

Os paradoxos da situação laboral actual das mulheres

27.05.11, flexbilizar ~ conciliar
Desafios e Paradoxos da Flexibilidade

Caracterizada durante muito tempo por um acesso limitado à educação e à formação profissional, a oferta de mão-de-obra feminina tem vindo a alterar-se radicalmente.
Face às novas exigências dos postos de trabalho, as capacidades de comunicação e de responsabilização, consensualmente reconhecidas ás mulheres, deveriam abrir-lhes boas perspectivas no mercado de trabalho. Possuir as aptidões e competências requeridas não tem acarretado, de facto, o reconhecimento da sua qualificação. Na verdade, o processo acelerado de feminização quer dos sistemas de ensino e formação quer dos mercados de trabalho não tem conduzido à eliminação da segregação e da discriminação no trabalho e no emprego.
Os paradoxos da situação laboral actual das mulheres resultam, não apenas, do facto de estas transformações coexistirem com a perpetuação de uma cultura empresarial que lhes é fortemente hostil, mas também da radicação de uma concepção social do trabalho de produção e de reprodução que não se limita a conotar positivamente a esfera da produção e negativamente a esfera da reprodução, mas que, para além disso, associa naturalmente as mulheres a esta última.
Só assim se compreende que os novos modelos de gestão não estejam afinal a responder melhor às necessidades de articulação do trabalho produtivo e reprodutivo.

Uma vez que estes novos modelos enfatizam a importância dos aspectos relacionais e da qualidade de vida profissional e da vida em geral e a atenção dada às necessidades das pessoas, poderíamos esperar que as mulheres tirassem deles algum benefício. A ênfase posta na flexibilidade, na humanização das relações de serviço, na cultura relacional e na centralidade do tempo é algo que poderia facilitar a integração das mulheres numa nova cultura empresarial, já que elas se encontram, em regra, habituadas a realizar várias tarefas ao mesmo tempo, a coordenar os tempos de trabalho e de não-trabalho, a atender às necessidades dos outros e a cultivar e fomentar as relações afectivas e familiares.
Estas potencialidades são, no entanto, torpedeadas no seu desenvolvimento, dado que as empresas tendem a oferecer um entendimento completamente diferente da flexibilidade. Para estas, flexibilidade significa alongamento da jornada de trabalho, às vezes com trabalho suplementar não-remunerado, disponibilidade total por parte dos trabalhadores para responderem às exigências da ‘produção’ e, fundamentalmente precarização do emprego. Quem não estiver disponível por ter pessoas dependentes a seu cargo é pouco flexível e desmotivado.
O trabalhador flexível dos novos modelos de gestão tal como são levados à prática tem, portanto, que ser alguém que vive sózinho ou de preferência que tenha alguém que cuide si. Há mesmo empresas na Alemanha que só recrutam homens casados com mulheres que não trabalhem fora de casa (Müller, 1998).
Uma mulher candidata a um emprego, se se encontrar na faixa etária dos 20 ou dos 30 anos, é encarada pelos empregadores como uma mãe potencial, o que na concepção de muitos empregadores significa uma trabalhadora de fraca produtividade, elevado absentismo, alheamento e falta de empenhamento e de flexibilidade no trabalho. É de conhecimento comum que é uma prática corrente em Portugal, já que a lei proibe o despedimento de mulheres grávidas, exigir-se às trabalhadoras que não engravidem durante a vigência dos contratos de trabalho. Já se registaram casos em que, inclusivé, as entidades patronais alegaram justa causa no despedimento de trabalhadoras que não se sujeitaram às regras impostas.
Outro indicador que aponta no mesmo sentido é constituído pelo facto de as denúncias de discriminação que chegam à Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) envolverem na sua maioria mulheres grávidas ou em licença de parto.
Em contraste com a situação descrita, verifica-se a preferência das entidades patronais pela contratação de homens casados, de preferência com filhos (e, se possível, empréstimo bancário para aquisição de casa própria), porque em sua opinião estes são mais responsáveis e mais estáveis. Ao contrário do que acontece com as mulheres, o seu papel de provedor da família torna-os melhores trabalhadores. Assim, um modelo que em teoria poderia favorecer a diminuição dos índices de segregação sexual das estruturas de emprego acaba por ter como efeitos perversos a perpetuação ou mesmo o agravamento das condições de trabalho e de vida das mulheres.
Não deixa de ser paradoxal que, sendo comum afirmar-se que a legislação laboral é bastante rígida, salvaguardando os direitos dos trabalhdores, Portugal apresente os mais elevados índices de flexibilidade externa do mercado de trabalho da UE, pelos quais são em especial responsáveis os contratos a termo certo e o trabalho temporário (Quaternaire, 1997).
Nesta dimensão da articulação entre trabalho remunerado e não-remunerado situa-se precisamente outro dos paradoxos da situação das mulheres em Portugal. Sendo das que mais se inserem no mercado de trabalho, são também das que contam com menos ajuda, já nem se diz partilha, das tarefas domésticas por parte dos homens. Os resultados de todas as sondagens disponíveis apontam unanimemente para uma participação dos homens que se cifra em torno dos 26% (quando é o homem a responder) e dos 3% (quando é a mulher quem responde) em tarefas como cozinhar, lavar a loiça, passar a ferro, arrumar e limpar a casa.
Num inquérito que realizei a 1520 pessoas de ambos os sexos que vivem em relação conjugal (formal ou não) e em que ambos os elementos trabalham fora de casa, as tarefas que mais frequentemente são citadas pelos homens como sendo da sua responsabilidade são: conduzir a família em viagem (81%), lavar e cuidar do carro (75%), pequenos arranjos dos equipamentos domésticos (66%), ir às repartições públicas (54%), fazer os churrascos (52%), levar as crianças a espectáculos desportivos (51%) e engraxar os sapatos (50%). O que ressalta desta lista de tarefas é, sobretudo, a sua descontinuidade, mas também a sua distância relativamente à casa. O seu carácter esporádico resulta de não possuirem uma periodicidade imposta. Os espaços em que se desenrolam, a estrada, o quintal, a garagem, a repartição pública, o estádio, são exteriores à casa (com a eventual excepção dos arranjos ou do engraxar dos sapatos que, de qualquer maneira, não têm que forçosamente ser feitos dentro de casa, como o são o limpar o pó, aspirar, arrumar, etc.). Trata-se, em resumo, de tarefas que se cumprem fora de casa e cujos conteúdos não têm uma obrigatoriedade pré-estabelecida.
Podemos dizer que, em parte como corolário destas duas características, as tarefas realizadas pelos homens acabam por ter uma visibilidade completamente diferente das tarefas de cumprimento diário obrigatório que são da responsabilidade quase exclusiva das mulheres (cuidar das toalhas e das roupas de uso diário e planear os menus, para além do cozinhar, arrumar a banca da cozinha depois das refeições, etc.). "O trabalho de uma mulher nunca está feito" diz o ditado (apetece acrescentar "por um homem"), porque o ciclo das tarefas que o compõem é muito curto, obrigando por vezes à repetição das tarefas várias vezes ao longo do dia (cozinhar, pôr a mesa, lavar, limpar e arrumar a louça).
Em entrevistas com mulheres operárias fabris, pude aperceber-me que o mesmo fenómeno de invisibilidade toca o destino dos seus salários. Estes destinam-se ao "governo do dia-a-dia", à compra dos bens de consumo imediato (alimentação, vestuário, calçado). Há uma despesa fixa que tende a sair do seu salário — a mensalidade da ama/creche/infantário/colégio, etc. — , como se tivesse que ser penalizada por exercer uma profissão.
Em oposição, ou de forma complementar, dirão alguns, o salário dos seus companheiros destina-se, depois de ele tirar para si a parte a que se acha com direito, sobretudo ao pagamento de despesas fixas (especialmente a renda ou a amortização do empréstimo da casa ou a prestação do automóvel ou da câmara de vídeo, etc.).
O salário da mulher desaparece na voracidade do consumo quotidiano, o do homem permanece bem à vista, incorporado nos bens de consumo duradouro. Em caso de divórcio, ele reivindicará a posse daqueles objectos, pagos com o ‘seu’ salário; ela perguntar-se-á em vão para onde foi o seu salário.
Da diferente natureza das tarefas realizadas pelas mulheres e pelos homens, resulta a grande diferença do tempo consumido por umas e outros com o trabalho doméstico. Objectar-se-á que isso se deve ao facto de os homens trabalharem mais horas. Ora, os dados de que dispomos quanto à ocupação do tempo no trabalho doméstico não corroboram esta ideia. Se existisse alguma correlação entre o número de horas que as mulheres e os homens trabalham e o nível de responsabilização do trabalho doméstico, então os homens portugueses deveriam estar entre os que mais tarefas domésticas desempenham e, no entanto, o seu nível de participação, avaliado em estudo recente, coloca-os no penúltimo lugar entre os países da UE, imediatamente antes dos seus vizinhos de Espanha, país em que se verifica a mais baixa taxa de actividade feminina.
Para entender este paradoxo, no caso português, é necessário ter em conta que vivemos até há pouco mais de vinte anos numa sociedade regulada por uma ordem jurídica que fazia do trabalho doméstico uma obrigação legal das mulheres.
O tradicionalismo do imaginário socio-cultural de muitos sectores está bem expresso em algumas sondagens sobre os comportamentos femininos considerados desejáveis, de acordo com os quais a maioria dos inquiridos não perdoa a uma mulher a infidelidade, que fale e se vista mal e que fume ou que beba alcool (Expresso, 26 de Novembro de 1994).
No inquérito sobre a divisão sexual do trabalho acima referido, mais de dois terços das pessoas inquiridas ainda declaram que em seu entender há profissões mais indicadas para mulheres e para homens (70% dos homens e 61% das mulheres). Mas a questão é muito mais profunda e, embora com uma acutilância especial em Portugal, este paradoxo está presente em todos as áreas geográficas e quadrantes sociais.
Os estudos feitos mostram que apenas a variável ‘período de afastamento da mulher de casa’ tem um efeito determinante na quantidade de trabalho doméstico realizado pelos homens, não sendo portanto relevante saber se a mulher trabalha mais ou menos horas, se ganha mais ou menos, se o homem está ou não desempregado (Müller, 1998). Somente face à ausência da mulher, o homem passa da condição líquida de recebedor à de prestador de cuidados. A esta luz, talvez possamos pôr como hipótese que as mulheres portuguesas se movem menos, de forma autónoma, quer dizer, em Portugal serão menos frequentes as situações em que as mulheres estão afastadas de casa. Hipótese perfeitamente possível se tivermos em conta a fraca mobilidade que caracteriza de um modo geral a mão-de-obra portuguesa, demasiado limitada nos seus movimentos por uma grande prevalência da posse de casa própria e, sobretudo, um mercado de habitação praticamente inexistente desde que as rendas foram congeladas, durante os anos 70.
Numa sociedade sem igualdade material, o paradigma jurídico da igualdade formal gera políticas paradoxais.
É sem dúvida uma lógica equivocada e paradoxal que leva à presunção de que os homens partilham equitativamente as responsabilidades dos cuidados prestados no âmbito da família. No Art.º 68.º da Lei Constitucional (nº 1/89 de 8 de Julho) pode ler-se " 1 - Os pais e as mães têm direito à protecção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível acção em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação, com garantias de realização profissional e de participação na vida cívica do País; 2 - A maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes; 3 - As mulheres trabalhadoras têm direito a especial protecção durante a gravidez e após o parto, incluindo a dispensa do trabalho por período adequado, sem perda da retribuição ou de quaisquer regalias".
Na versão de 1976, a constituição falava na insubstituível acção materna junto aos filhos e no valor social eminente da maternidade.
Na revisão constitucional de 1982, a paternidade foi colocada lado a lado com a maternidade, equiparando as exigências do papel do pai às do papel da mãe, para efeitos de integração profissional e cívica.
Quando se sabe que afinal apenas uma minoria dos homens partilha as tarefas domésticas ou a prestação de cuidados devidos às crianças e outros dependentes, a igualdade formal que não é complementada com estruturas de apoio à família, na verdade, agrava as desigualdades entre os sexos no plano material.
Se é verdade que a ordem jurídica instaurada nos anos setenta se funda numa concepção de cidadania universalista, ao considerar homens e mulheres igualmente produtores e reprodutores, está a compactuar e, provavelmente, a reforçar práticas sociais desiguais e injustas.

Por Virgínia Ferreira
Socióloga, Faculdade de Economia da Universidade
Ler a integralidade do artigo em http://www.mulheres-ps20.ipp.pt/MP_Sit_Paradoxos.htm

Super-mulheres de família

26.05.11, flexbilizar ~ conciliar
O papel da mulher tem caminhado ao longo de um trilho de grandes mudanças, marcado por um aumento exponencial de exigências. É-lhe cada vez mais solicitado que se transforme em super-mulher e que mantenha, em todas as situações, estampado no rosto um sorriso igual ao do super-homem.

Mas aquilo que a sociedade se esquece, ou faz por esquecer, é que mesmo esta personagem tem uma fraqueza principal, a chamada Kryptonite, que absorve os seus poderes e a impede de salvar o mundo. E até aqui se vê a evolução dos tempos. Para a mulher não é apenas uma substância que absorve as suas capacidades, mas várias. O stress, o trabalho e as tarefas domésticas são os principais perigos que enfrenta quando tenta salvar o seu mundo e ser mais, e melhor, para a sua família.

Quando se pensa na solução para esta problemática, a resposta não aparece automaticamente, mas também não é impossível. Mesmo que a sociedade tente conter os movimentos no sentido de um bem-estar, o ser humano tem sempre a sua liberdade de escolha e um sem fim de possibilidades. O bom senso diz-nos que é possível trabalhar em horário reduzido e mesmo assim ir de encontro à produtividade esperada pelo empregador. E algumas sociedades mostram-nos como sendo viável, e até consagrado na lei.

Distanciando-nos um pouco deste lado mais pragmático, mas tendo-o como pano de fundo, sabe-se que são inúmeras as vantagens para a mulher, e por consequência para a família e o trabalho, ver validada uma oportunidade de flexibilização de horários. De um modo geral, a capacidade em manter um equilíbrio entre o trabalho e a família, assim como um envolvimento permanente, são sinónimos de uma vida preenchida e “bem vivida”.1 Mulheres que retornam ao mercado de trabalho – após a licença de maternidade – e passam a funções em part-time, sentem-se mais realizadas e são mais felizes, particularmente se a redução não implicar uma alteração do estatuto no local de trabalho.2 Esta felicidade traduz-se numa maior disponibilidade emocional, e física, para apoiar os filhos durante o seu crescimento e ajudá-los a ultrapassar eventuais dificuldades, assim como numa maior abertura para criar um espaço de relação entre o casal, e com os filhos, mais próximo e enriquecedor.

Principalmente nos primeiros anos de vida dos filhos é importante para a mulher estar presente e sentir que não irá perder nenhum momento decisivo do desenvolvimento dos mesmos. Quando os filhos se sentam pela primeira vez, quando dizem a primeira palavra, quando entram para a creche ou escola, quando perdem o primeiro dente, ou quando vão para o futebol ou o ballet, ou a ginástica, etc, a mãe quer estar lá, ao lado e apoiante.

Por todos estes motivos é impreterível que a mulher não se sinta dividida entre o trabalho e a família mas possa ter, pelo contrário, o melhor dos dois mundos. A felicidade, a sensação de bem-estar, a realização pessoal, assim como um melhor equilíbrio entre as duas grandes áreas da vida, são aspectos importantes na prevenção de algumas patologias como o stress, a ansiedade, a depressão e as perturbações do sono.
E como falamos em família, obviamente, não nos podemos esquecer de referir que também para os homens o equilíbrio entre a família e o trabalho é importante e mais, na nossa sociedade o papel do pai tem igualmente sofrido algumas mudanças de paradigma. Actualmente, muitos pais escolhem ficar em casa ou ter horários reduzidos para acompanharem mais de perto o desenvolvimento dos filhos. E claro, para as crianças, também as escolhas que ambos, mães e pais, decidem abraçar, têm impacto no seu desenvolvimento.
Neste sentido, e nas próximas semanas, iremos dedicar o nosso espaço de partilha a um olhar atento e cuidado sobre os pais e os filhos.

Cátia Santos
Psicóloga, área Psicologia Clínica
Publica artigo de psicologia no "Revolucionar para Flexibilizar" às 5as feiras e responde aos comentários no blogue ou no e-mail psicologiaparaflexibilizar@gmail.com.

1 Allen, T. D., Herst, D. E., Bruck, C. S., & Sutton, M. (2000). Consequences associated with work-to-family conflict: A review and agenda for future research. Journal of Occupational Health Psychology, 5, 278-308.
2 Holst, E., & Trzcinski, E. (2000) . High satisfaction among mothers who work Part-time. Economic Bulletin 40 (10), 327-332.


Teletrabalho

25.05.11, flexbilizar ~ conciliar
O teletrabalho tem sido das formas de organização de trabalho que mais polémica tem levantado, por um lado porque algumas empresas antecipam assim os despedimentos e o encerramento de áreas de negócio, por outro porque os trabalhadores acabam resvalando em termos dos projectos.

A wikipedia dá um bom resumo das vantagens e desvantagens deste tipo de prestação do trabalho, quer para os empregadores, quer para os trabalhadores. No essencial, existem hoje em dia várias tecnologias que facilitam o acesso informático às redes da empresa, legislação que abrange a casa dos trabalhadores durante as horas de serviço, formas de controlar resultados e objectivos. O que continua a faltar é a mentalidade, a atitude, a forma de ver as coisas.

O teletrabalho é ideal para uma série de funções em que o trabalho é feito por projectos e depende de muito trabalho solitário, quer criativo, quer administrativo. As vantagens para a empresa são óbvias uma vez que muitos dos custos do posto de trabalho podem ser eliminados, mas as contrapartidas também são grandes. Aquilo que os trabalhadores podem oferecer são formas mais apertadas de controle sobre o seu trabalho – como os relatórios de actividade ou a contabilização de tarefas.

A combinação entre o teletrabalho e o trabalho localizado na empresa apenas alguns dias da semana pode ser uma solução para as questões relacionadas com o trabalho em equipa, com o espírito de pertença à empresa e com o controle necessário por parte do empregador.


Acima de tudo o importante é que seja um bom negócio para ambas as partes: que o trabalhador consiga conciliar melhor a sua vida pessoal e profissional estando presente nas alturas críticas de ambos os lados; e que o empregador sinta que consegue mais trabalho e menos custos.

Nada como sugerir uma experiência, num projecto concreto, ou num tipo concreto de tarefa. Dado que isto é mais óbvio para profissões e funções mais especializadas, também acredito que seja possível no caso das funções administrativas e até de apoio administrativo directo – é uma questão de organização.

Quando a experiência resulta todos ficam surpreendidos e agradados, mas é muito muito difícil convencer os chefes e os patrões a experimentar, por isso deixo a sugestão / provocação de que tentem quando não resta aos empregadores outra alternativa senão aceitar. Por exemplo numa baixa pessoal ou de assistência à família, por exemplo num período de férias obrigatórias por não se terem esgotado as do ano anterior: “não vou estar por direito meu, mas pela empresa posso fazer a experiência do teletrabalho e ver como resulta”.

Que isto não soe como um conselho para partir um pé e ter que trabalhar de casa, porque a maioria das empresas nem sequer vai aceitar, preferindo não correr o risco de abrir o precedente. Mas em casos pontuais, em que vejam surgir a oportunidade, nada como tentar. O “não” está garantido. E as vantagens para ambos os lados também podem estar.
Uma vez conseguido o teletrabalho é preciso alguns cuidados por parte do trabalhador, organização e disciplina para não deixar de cumprir as suas obrigações e não se deixar distrair pelo ritmo alucinado do quotidiano com a família em casa – é jornada dupla para as mães! O isolamento das equipas e a perda de sentido de pertença também podem ser assegurados com contactos regulares com a empresa, seja comparecendo a reuniões periódicas, seja convivendo com os colegas numa ou noutra reunião e almoço. O importante é conseguir manter a camisola vestida e mostrar que se pode pertencer, cumprir e estar em casa. Não é fácil e pode parecer muito mais duro do que cumprir o 9h-17h habituais, mas por vezes compensa poder estar presente em alturas que ninguém imaginaria que aconteceriam ou poder organizar o ritmo de vida de forma mais produtiva em todos os sentidos.

Garantidamente que o cafézinho se torna mais curto e os corredores menos concorridos, mas também é verdade que o isolamento pode ser apenas para alguns!

Ana Teresa Mota
(Consultora em Recursos Humanos)
rhparaflexibilizar@gmail.com

Teletrabalho ganha dinâmica em contexto de adversidade

24.05.11, flexbilizar ~ conciliar
O teletrabalho está a tornar-se para muitas empresas uma ferramenta viável para enfrentar a crise. À redução dos gastos para as organizações, aliam-se as vantagens para os trabalhadores que também poupam dinheiro nas deslocações e refeições fora de casa. A Era do e-work parece estar a ganhar expressão.
Há muito que a Europa acordou para o potencial do teletrabalho, mas em Portugal esta forma de trabalhar tem ainda uma tímida expressão. São ainda poucas as organizações a aplicar de forma permanente esta metodologia, ainda que muitas coloquem já o e-work como uma possibilidade pontual para os seus colaboradores. Mas, a crise e adversidade económica que o país atravessa poderão impulsionar o teletrabalho nas empresas nacionais.

Segundo a Albenture, empresa especializada na conciliação da vida profissional e familiar, “apesar de ainda nos encontrarmos abaixo da média europeia e longe da situação vivida em países como a Suécia e a Dinamarca, em Portugal continua a aumentar o número de empresas que têm implementado o teletrabalho como modelo laboral permanente ou flexível, alcançando percentagens elevadas de empregados que já trabalham a partir de casa”. A empresa não fornece dados estatísticos deste crescimento, mas enfatiza a crescente procura que tem tido por serviços de conciliação entre a vida profissional e família, onde o teletrabalho entra como metodologia.
Nesta empresa, metade do quadro de empregados usufrui da possibilidade de não ter de ir ao escritório para cumprir com a sua obrigação profissional e segundo Filomena Chainho e Regina Cruz, responsáveis da Albenture Portugal, “esta medida permite economizar tanto por parte da empresa como por parte do trabalhador, além de conseguir que nos sintamos mais confortáveis e satisfeitos profissionalmente”.

As mulheres são, segundo dados recentes desta empresa quem mais solicita as ferramentas de conciliação entre trabalho e família, com preferência pelo teletrabalho. Filomena Chainho, por exemplo, reconhece que “a possibilidade de estar em casa facilita a vida em termos de economia de tempo e sinto também que me reduz o srtess e aumenta a produtividade, pois se tiver de acabar alguma coisa posso sempre prolongar o trabalho pelo serão, sem ter a preocupação de sair a correr para ir buscar a minha filha ao infantário e ir para casa”.

Redução de gastos associados ao espaço físico (energia, água, consumíveis informáticos, etc), aumento de produtividade e melhoria do rendimento dos colaboradores figuram entre as principais vantagens para as empresas, mas há outras. Segundo a Albenture, “o teletrabalho contribui para a retenção do talento nas empresas e permite captar novos profissionais que se encontrem em áreas geográficas mais afastadas dos escritórios da empresa”. Paralelamente. o facto de se reduzir o tempo de deslocação dos colaboradores para a empresa, faz com que o tempo seja diretamente investido na realização de trabalho e com que diminua o absentismo entre os funcionários, aumente a capacidade de resposta às necessidades dos clientes, bem como a competitividade e a busca pelo conhecimento por parte dos colaboradores.
Para os e-trabalhadores, a possibilidade de conciliar melhor a carreira e a família, o maior conforto na execução do trabalho, a diminuição do stress laboral e a redução significativa das despesas de transportes e alimentação são argumentos de peso para trabalhar a partir de casa.

Artigo do Expresso Emprego
http://aeiou.expressoemprego.pt/Actualidades.aspx?Art=1&Id=2496

Wiz Interactive - Empresa Familiarmente Responsavel

20.05.11, flexbilizar ~ conciliar
Wiz Interactive (Wiz – Serviços de Internet, Lda.)
Desenvolvimento de aplicações e prestação de serviços na internet.
Inicio de actividade em 1998
21 empregados

Na apresentação da empresa dizem tratar-se de uma estrutura dinâmica e informal orientada para a liberdade de todos darem o seu melhor em cada projecto. Nessa orientação têm em conta a conciliação da vida profissional com a vida familiar, ou seja, os trabalhadores têm flexibilidade na organização e horários de trabalho?

Nuno Silva - Sem dúvida, não apenas aquela que a lei permite, mas muito mais do que isso. Acreditamos que os ciclos de criatividade e produtividade de cada um varia consoante o seu bem estar e os do que os rodeiam. Não só as obrigações relacionadas com filhos e família mas também o seu próprio bem estar. Na Wiz não há um horário rígido, embora obviamente, e por questões de equipa, haja alguns blocos (e dias , 2ª feira por exemplo, que é quando fazemos a reunião semanal de projectos) que solicitamos que as pessoas estejam presentes, para não comprometer os colegas e os projectos e todos entendem e apoiam isso. Mas qualquer pessoa é livre de tirar uma manhã, ou uma tarde ou mesmo um dia, para tratar de assuntos pessoais, ir buscar a filha ao colégio, simplesmente porque precisa de brincar com ela, porque têm de ir ao médico, ou simplesmente porque necessita de espairecer. Acima de tudo responsabilizamos muito cada empregado, ele sabe que o seu trabalho é importante para a equipa e para sucesso dos projectos e por isso sabe que se hoje precisa de sair da parte da tarde, amanhã compensará (não necessariamente em termos de horas, mas de trabalho efectivo). Na Wiz não temos faltas, não acreditamos que reduzindo o vencimento por 1 ou 2 dias, a empresa e o trabalhador vá ganhar alguma coisa com isso. Preferimos que o trabalhador sinta que um dia estamos a dar e que quando for necessário gostaríamos de receber. Obviamente que também não é uma “bandalheira”, tal como disse as pessoas são responsabilizadas e por isso responsabilizam-se relativamente ao seu papel no todo.

As vantagens são óbvias para o trabalhador que opta por essa flexibilidade e para a empresa, consideram que existem igualmente vantagens? Quais?

Nuno Silva - Claro, a vantagem é ter uma equipa saudável mentalmente, feliz e realizada tanto ao nível pessoal como profissional. Sabem que elas fazem parte de uma equipa e que fazem a diferença e por isso esforçam-se por dar o seu melhor. Partilham de uma forma muito mais intensa as alegrias e infelizmente também as derrotas.

E desvantagens?

Nuno Silva - Essencialmente existem apenas 2 desvantagens: A primeira relaciona-se com o imprevisto, por sermos uma equipa não muito grande, se alguém precisa de sair, ou avisa a dizer que não vêm, isso pode condicionar o projecto e os timings do mesmo (mas mesmo nessas situações há sempre alguém pronto a ajudar, porque sabe que no dia seguinte pode ser ele(a) a necessitar). A segunda (e felizmente não muito frequente) está relacionada com a imaturidade de algumas pessoas (normalmente mais jovens e inexperientes, ou que venham de outras empresas demasiado rígidas) que confundem flexibilidade com laxismo .
Nem todas as pessoas têm perfil para trabalhar num registo flexível, há quem prefira cumprir um horário pré-definido. Dentro de uma empresa é possível conciliar estas duas realidades?

Nuno Silva - Sem dúvida, temos trabalhadores, alguns com filhos, que preferem entrar todos os dias às 9h e sair às 18h, fazer a sua hora de almoço, sempre à mesma hora, e são respeitados, responsabilizados, elogiados e criticados da mesma forma.

Consideram que a gestão dessa dualidade (os que optam pela flexibilidade e os que preferem a “inflexibilidade”) deve ser feita pelos diferentes departamentos, ou desde logo no recrutamento das pessoas?

Nuno Silva - Não há uma directiva aquando o recrutamento. Quando convidamos as pessoas a integrar a nossa equipa, é explicado o modo como funcionamos. É no decorrer do seu inicio de actividade na empresa, sentindo o pulso à mesma, e a equipa sentindo o pulso ao novo membro que o trabalhador decide como prefere trabalhar. Mas mesmo os que preferem a rigidez, optam pontualmente (por necessidades familiares ou próprias) por ter alguma flexibilidade e sabem que não lhe é negada, respeitando obviamente a equipa e os projectos em que estão inseridos.

Podemos afirmar que a flexibilidade é efectivamente uma mais valia para a empresa, ou o nosso mercado de trabalho não está ainda preparado para isso?

Nuno Silva - Acredito na flexibilização, sei que em algumas áreas de actividade, nomeadamente em estruturas produtivas mais rígidas (do ponto de vista da própria produção, fábricas por exemplo), é mais difícil, entender os benefícios do mesmo, quer por parte das entidades patronais, quer mesmo por parte de alguns trabalhadores. Mas mesmo aqui, pode haver uma flexibilização, obviamente não da mesma forma como a Wiz (que é uma pequena empresa, onde todos dialogam com todos e as hierarquias existem apenas por questão de organização de trabalho e não por uma questão de força (um designer têm a mesma importância para nós como um director criativo)
Acredito que só desta forma deixa de existir a “guerra” antiga que opõe empregadores e empregados como se fizessem parte de 2 eixos diferentes da empresa, quando a meu ver a empresa é só uma e se uns ganharem todos ganhamos com isso.

http://www.wiz.pt/

Estudo e resultados do Projecto Conciliação trabalho-familia

19.05.11, flexbilizar ~ conciliar
APFN e Universidade Católica apresentam estudo e resultados do Projecto Conciliação
Dois terços dos portugueses têm dificuldade em conciliar a vida profissional e familiar
• Estudo inédito em Portugal revela que metade dos portugueses considera que o trabalho dificulta a sua vida familiar
Equilíbrio entre o trabalho e a família é importante para 66% dos portugueses
• Estabelecida parceria entre Portugal e Noruega para a criação de uma «Rede para a Conciliação» com responsáveis autárquicos, governamentais e empresariais

A criação de uma «Rede de Conciliação» entre Portugal e a Noruega e a apresentação de um estudo sobre a conciliação entre a vida profissional e familiar em Portugal, são dois dos principais resultados do projecto «Conciliação para a Geminação» que durante três anos juntou responsáveis autárquicos, governamentais e empresariais dos dois países.
A Conferência, que assinala o final do projecto e onde foram apresentados os seus principais resultados, teve lugar hoje no pólo de Lisboa da Universidade Católica, numa organização da Associação Portuguesa de Famílias Numerosas (APFN) e do Instituto de Ciências da Família da Universidade Católica Portuguesa.
“Através da parceria com a Noruega conseguimos reunir diferentes entidades públicas e privadas e dar um importante contributo para o aumento da consciencialização social e para a promoção de uma cultura para a conciliação entre trabalho e vida familiar, reforçado também pela troca de informação e experiências”, avança Eva Carvalho, uma das responsáveis pelo projecto.”Este estudo mostra que há muito trabalho a fazer a este nível, e a criação da rede com a Noruega vai também permitir aos nossos governantes, autarcas e empresários, aprenderem com as melhores práticas” conclui.
Estudo Conciliação entre a Vida Profissional e Familiar Realizado pela Universidade Católica, este estudo ouviu a opinião de 800 portugueses sobre a conciliação entre o trabalho e a família.
As principais conclusões mostram que sensivelmente o mesmo número de inquiridos considera importante a conciliação da vida familiar com a vida profissional (66%) e/ou afirmam ter dificuldade em efectuar a conciliação (64%). A registar que tanto homens (59%) como mulheres (69%) mencionam essa dificuldade.
A nível organizacional, das medidas de conciliação mais conhecidas pelos portugueses, encontram-se o horário de trabalho flexível, regime de turnos e estatuto trabalhador/estudante.
A nível legal, as medidas que os portugueses conhecem melhor são os subsídios sociais de maternidade, o abono de família e abono de família pré-natal e a dispensa para amamentação/aleitação.
O apoio e acesso a cuidados médicos é a medida considerada pelos inquiridos como a mais importante em prol de uma melhor conciliação familiar e profissional. O contexto económico surge como factor principal a ter em conta, tanto em termos profissionais, como na gestão da vida familiar.

Rede para a Conciliação
Com a participação de entidades públicas e privadas, este novo projecto tem como objectivo facilitar a troca de informação e conhecimento, a disseminação de boas práticas e a criação de novos produtos relacionados com a conciliação pessoal, profissional e familiar. Também a promoção da igualdade de oportunidades é um dos objectivos desta rede.
A iniciativa «Conciliação para a Geminação» visa aumentar a consciencialização social para a conciliação entre o trabalho e a vida familiar, bem como a capacidade de concretização de políticas, através de diagnósticos organizacionais, implementação de medidas concretas de conciliação e outras actividades relacionadas com esta matéria.
Sobre o projecto «Conciliação» financiado por Islândia, Liechtenstein e Noruega no âmbito do Mecanismo Financeiro do Espaço Económico Europeu (EEE) e com a coordenação do Instituto de Ciências da Família da Universidade Católica Portuguesa, o projecto «Geminação para a Conciliação - Geminação de instituições Portuguesas e Norueguesas para a conciliação entre a família e a vida profissional» é promovido pela Associação Portuguesa de Famílias Numerosas e tem como parceiros a Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP), a Associação Norueguesa das Autoridade Locais e Regionais (KS), o Gabinete de Estudos e Planeamento (GEP) do Ministério de Trabalho e Solidariedade Social, a Câmara Municipal de Leiria e a Câmara Municipal de Faro.

IN Noticias do Douro (edição de 1-04-2011)

Jornadas Contínuas

18.05.11, flexbilizar ~ conciliar
Vamos tentar abordar as diferentes medidas de flexibilização e explorar as várias possibilidades, mesmo que não sejam medidas consagradas, desde que cumpram o objectivo de harmonizar e equilibrar a vida familiar e a vida profissional. Todas as quartas-feiras vamos escolher uma das medidas e tentar lançar as bases para a discussão e hoje optei pela jornada contínua.
A jornada contínua é uma forma de organização do trabalho que é praticada na função pública, e mais raramente em algumas grandes empresas, tendo por objectivo permitir às mães um acompanhamento mais presente nas horas de entrada e saída da escola das crianças, dispensando a hora de almoço. Consiste numa redução do horário para 6 horas diárias sem intervalo para almoço.

Durante a hora do almoço, as trabalhadoras mantém-se no seu posto de trabalho, com uma pausa de 10 minutos para assegurar o descanso legalmente previsto e trabalham menos uma hora que as restantes, compensando o trabalho com uma maior focalização decorrente da falta de interrupção, que é uma vantagem prática para a empresa.

Embora muitas empresas já tenham detectado a insatisfação dos clientes pelas dificuldades de contacto no período de almoço que leva a problemas desde o meio dia e meia até às 15h, poucas foram as que resolveram a situação dando às trabalhadoras a oportunidade da jornada contínua.

A maioria das empresas de serviços ganha bastante se os seus clientes puderem contar com a garantia de disponibilidade no período de almoço.

No caso dos serviços internos das empresas, sejam estas de produção ou de serviços, todos ficam a ganhar e há aumentos notáveis de produtividade, com a possibilidade de acesso aos serviços internos, como tesouraria e contabilidade, informática ou recursos humanos, no período do almoço.

Dado que um dos maiores obstáculos à jornada contínua costuma ser o regime de excepção que representa, se as coisas forem vistas (e apresentadas) na perspectiva da empresa, este “benefício” relativiza-se e pode mesmo ser visto como um investimento.

A rentabilização da jornada contínua e do regime de exceção que representa podem ser potenciadas pela forma como é divulgada. Uma boa divulgação junto de clientes, fornecedores e colaboradores permitem que esta disponibilidade seja vista como um benefício ou um serviço extra, destinado a aumentar a produtividade internamente e a rentabilizar todas as oportunidades de contacto com os clientes.

As funções mais complicadas, do meu ponto de vista, serão as de turnos com horários rotativos, de atendimento de público com horas invulgares e as funções comerciais e de direção, dado que este esquema da jornada contínua é, à sua maneira, menos flexível e não responde às necessidades de clietnes e equipas que funcionam a horas mais tardias ou mais matutinas.

Aquelas onde a empresa mais terá a ganhar serão as funções internas e administrativas.

E agora ponho-me de lado para que possamos trocar ideias, sobre a aplicabilidade desta jornada contínua ao caso de cada um/uma, quer na perspectiva da empresa em que trabalham e da função que executam, quer na perspectiva de pais/mães e das vantagens que um regime destes vos traria.

Ana Teresa Mota
Consultora Recursos Humanos
(rhparaflexibilizar@gmail.com)

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